Alertas se dão em razão do surgimento de casos em boa parte do território nacional, mas em Minas Gerais as autoridades têm agido rápido. Atividades do IMA incluem caçada aos morcegos.
Nesta ultima quinta-feira, 28 de setembro, foi o Dia Mundial de Combate à Raiva, data estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) para alertar a sociedade sobre os cuidados que devem ser tomados com relação a uma das doenças mais letais do planeta. Em Minas Gerais, estado que possui o segundo maior rebanho bovino do país, o Governo do Estado, por meio do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) trabalha uma série de ações preventivas durante todo o ano e alerta os criadores a vacinar os animais.
Na agropecuária mineira, o rebanho bovino se destaca com 24 milhões de cabeças, atrás apenas do Mato Grosso. Minas Gerais lidera a produção nacional de leite, com mais de oito bilhões de litros anuais, o que significa um terço do total produzido no Brasil. A produção de carne também é significativa para consumo interno e exportação.
Diante da importância socioeconômica da atividade pecuária, o IMA tem ampliado a cada ano o seu trabalho de prevenção da raiva bovina, doença infectocontagiosa do sistema nervoso, que tem como agente etiológico o vírus rabdovírus, que ataca, principalmente, mamíferos.
A transmissão para os bovinos se dá pelos morcegos hematófagos, especialmente, o Desmodus rotundus, mas as outras duas espécies (Diphylla ecaudata e Diaemus youngi) também podem transmitir a doença mortal em praticamente 100% dos casos.
O vírus está na saliva do animal que entra em contato com uma ferida, pois o vírus não atravessa a pele íntegra. Existem ainda relatos da transmissão por via aérea, que ocorrem em cavernas e locais fechados que abrigam morcegos doentes.
Estrutura do IMA e panorama atual
De acordo com o coordenador do Programa Nacional de Controle da Raiva em Minas Gerais, Jomar Zatti, o IMA possui 600 servidores treinados em todo o estado para o combate à doença. Existem 20 coordenadorias regionais e uma parceria efetiva com todas as prefeituras.
“Há um trabalho permanente de controle, palestras, conscientização mesmo. A orientação aos produtores sobre a vacinação do rebanho é imprescindível”, ressalta Zatti.
Onde houver algum caso de raiva, recomenda-se vacinação imediata de todo o rebanho e vistoria nas propriedades no raio de 20 km. Após 30 dias, os animais receberão a segunda dose e depois de seis meses após a primeira vacinação, aplica-se a terceira dose.
A orientação do IMA é de que a vacinação contra a raiva deve ser realizada a cada seis meses, no mesmo período da imunização contra a febre aftosa. Os novos animais devem ser vacinados com dias 30 de nascimento. Quando não há foco na região, a recomendação é para vacinar com três meses de idade.
Zatti esclarece que a raiva é cíclica, mas existem anos em que ela surge com mais força. Em 2017, os produtores estão mais atentos à necessidade de seguir as recomendações do IMA. “Com o surto na divisa de Minas com São Paulo, todos estão vendo que o melhor é vacinar, pois a raiva não tem cura e significa prejuízo quando um animal é infectado”, afirma.
O coordenador alerta também que é extremamente importante a vacinação dos animais domésticos (cães e gatos), pois os morcegos mantêm o vírus na natureza. Além disso, os animais silvestres que habitam as terras da propriedade também ficam expostos e podem ter algum tipo de contato com outros animais.
Se algum animal manifestar os sintomas da doença é preciso comunicar o IMA e o Departamento de Zoonoses do município para que seja feito o trabalho de captura dos morcegos. Existe uma parceria entre Estado e município que facilita o combate e recolhimento do material do animal para exames.
A sintomatologia clássica do bovino é de que no primeiro dia o animal se afasta do rebanho e começa a babar; no segundo dia ele não se alimenta mais; no terceiro começa a arrastar os membros traseiros; no quarto dia se deita; e no quinto dia ele morre com a cabeça voltada para trás.
Pode haver alguma variação, mas normalmente esses são os sintomas e a cronologia. Nenhuma medicação oral deve ser ministrada ao animal. A confirmação dos casos de raiva se dá pelo exame laboratorial do material coletado do cérebro do animal.
Outro cuidado: o produtor rural que registrar algum acidente, for arranhado e sofrer alguma mordida, deve lavar a ferida com água e sabão para avaliação médica. Se acidentar com morcegos, o médico também deve ser procurado.
Capturar os morcegos
Ramon Martinez Marin Neto, 52 anos, técnico em agropecuária do IMA é fiscal assistente na Coordenadoria Regional em Pouso Alegre há nove anos. Ele exerce uma atividade fundamental para o controle do morcego hematófago (transmissor da raiva).
Uma das suas atribuições nem sempre é atrativa para a maioria das pessoas: ele e seus colegas capturam, quase sempre à noite, os transmissores da doença, em expedições por áreas rurais.
Segundo Marin Neto, há um trabalho constante de monitoramento, por meio de observação e captura. “Fazemos o controle populacional e todas as prevenções sem eliminar o abrigo dos morcegos. Mas o maior desafio nesse trabalho de combate à raiva é a localização desses abrigos, pois exige tempo e pessoal disponível”, explica.
Na difícil tarefa de localização, o IMA pede sempre a ajuda do criador de gado onde há indícios e, em seguida, monta-se uma força-tarefa. A captura ocorre, quase sempre, à noite, entre 22h e 23h, quando os morcegos saem das cavernas em busca de sangue, sua alimentação.
Nessa captura é feito o controle populacional, por meio da aplicação de uma camada de pasta vampiricida, e os morcegos são soltos. Quando eles retornam às colônias, outros animais terão contato com a pasta, que leva os animais à morte. Para cada morcego que recebeu a pasta, de dez a 20 morcegos morrem.
Somente em ambientes artificiais, como casas ou túneis, a tarefa pode ser realizada durante o dia. Marin Neto conta que em maio deste ano, em Jacutinga (Território Sul), houve cerca de 40 mortes de equinos e bovinos, sendo que nove deles comprovadamente de raiva. A população ficou apreensiva, mas foi devidamente bem informada pela força-tarefa do IMA e servidores municipais.
Entre os desafios e situações diversas na caçada aos morcegos, o técnico sempre cita que encontra parceiros no próprio IMA, nas propriedades rurais e nas prefeituras. No IMA, conforme a legislação, os profissionais devem ser técnicos em agropecuária ou médicos-veterinários. Nas prefeituras, o apoio vem de profissionais da saúde, principalmente do Departamento de Zoonoses.
Susto em Jacutinga
Jacutinga tem cerca de 25 mil habitantes e está localizada na divisa com o estado de São Paulo. O município é reconhecido como polo de malhas de tricô. Seu rebanho bovino possui aproximadamente 22 mil cabeças.
Quando lá apareceram os primeiros animais mortos, a prefeitura procurou o IMA, que respondeu imediatamente com parceria. “Iniciamos um trabalho intenso de conscientização junto aos criadores, orientação com palestras, vacinação e coleta de material de animais mortos para análise laboratorial”, revela o diretor da Secretaria de Agricultura, Hildo Farhat Legatti.
Na ocasião, um funcionário da prefeitura ficou exclusivamente localizando abrigos com a ajuda dos criadores de gado.
“Foram encontrados quase 30 e houve também uma resposta rápida dos produtores rurais com a vacinação do rebanho. Pessoas que tiveram contato com os animais suspeitos se dirigiram ao serviço de saúde e foram vacinadas. A situação está sob controle, mas vamos continuar o trabalho com o IMA, que foi um parceiro e tanto”, conclui Legatti.